Entre os Mundos
CRIAÇÃO
Solitária,
majestosa, plena em si Mesma ,
a Deusa, Ela, cujo nome não pode ser dito, flutuava no abismo da escuridão,
antes do início de todas as coisas. E
quando Ela mirou o espelho curvo do espaço negro, Ela viu com a sua luz o seu
reflexo radiante e apaixonou-se por ele.
Ela induziu-o a se expandir devido ao seu poder e fez amor consigo mesma
e chamou Ela de "Miria, a Magnjica
O seu êxtase
irrompeu na única canção de tudo que é, foi ou será, e com a canção surgiu o
movimento, ondas que jorravam para fora e se transformaram em todas as esferas
e círculos dos mundos. A Deusa encheu-se de amor, que crescia, e deu à luz uma
chuva de espíritos luminosos que ocuparam os mundos e tornaram-se todos os
seres.
Mas, naquele grande movimento, Miria foi levada embora, e
enquanto Ela saía da Deusa, tornava-se mais masculina. Primeiro, Ela tornou-se o Deus Azul, o
bondoso e risonho deus do amor. Então,
transformou-se no Verde, coberto de vinhas, enraizado na terra, o espírito de
todas as coisas que crescem. Por fim,
tornou-se o Deus da Força, o Caçador, cujo rosto é o sol vermelho mas, no
entanto, escuro como a morte. Mas o
desejo sempre o devolve à Deusa, de modo que ele a Ela circula eternamente,
buscando retornar em amor.
Tudo começou
em amor; tudo busca retornar em
amor. O amor é a lei, mestre da sabedoria e o grande revelador
dos mistérios.
"A
idéia dos sioux sobre as criaturas vivas é a de que as árvores, o búfalo e os
homens são espirais de energia temporária, padrões de turbulência... esse é um
reconhecimento intuitivo e primitivo da energia como uma qualidade da
matéria. Mas esse é um insight antigo,
sabe-se extremamente antigo - provavelmente o insight de um xamã
paleolítico. Essa percepção encontra-se
registrada de várias maneiras no saber primitivo e arcaico. Diria que esta é, provavelmente, o insight
fundamental da natureza das coisas, e que a nossa visão ocidental, recente e
mais comum, sobre o universo como sendo constituído de coisas fixas está fora
da direção principal, um afastamento da percepção humana fundamental."
Gary
Snyder'
A mitologia e
a cosmologia da Bruxaria estão enraizadas naquela "intuição de um xamã
paleolítico": a de que todas as coisas são espirais de energia, vórtices
de forças em movimento, correntes em um mar sempre em mutação. Subjacente à aparência de
isolamento, de objetos fixos em um curso linear de tempo, a realidade é um
campo de energias que se solidifica, temporariamente, em formas. Com o tempo, todas as
coisas "fixas" se dissolvem, apenas para se fundirem novamente em
novas formas, novos veículos.
Esta visão do
universo como uma interação de forças em movimento - a qual, incidentalmente,
corresponde, em um grau surpreendente, aos pontos de vista da física moderna -
é o produto de um tipo muito especial de percepção. A consciência comum que desperta vê o mundo
como sendo fixo; ela focaliza uma coisa de cada vez, isolando-a do entorno, um
pouco como ver uma floresta escura com o auxílio de um estreito raio de luz que
ilumina uma só folha ou uma pedra solitária.
A consciência extraordinária, a outra modalidade de percepção, é ampla,
holística e indiferenciada, enxerga padrões e relacionamentos no lugar de
objetos fixos. É a modalidade da luz das estrelas: pálida e prateada, revelando
o jogo de rumos entre laçados e a dança das sombras, sentindo caminhos como
espaços no todo.
Starhawk em A Dança Cósmica Das Feiticeiras.